POR
QUE CRITICAM O CAPITALISMO ?
Celso Vallin, nov,2018
Nossa crítica ao
capitalismo não é somente aos ricos ou à burguesia. É ao
capitalismo mesmo, como lógica da vida, que segue colocando o lucro
acima de tudo, mesmo entre os que não são empresários.
Para pensar sobre isso é
bom questionar: Como a lógica de mercado se sobrepõe e sufoca as
demais lógicas da vida?
A base do racionalismo de
mercado é: “o lucro acima de
tudo”! Essa premissa não é só do empresário, dono de tais
lucros, e beneficiário do lucro, mas de todo o sistema que diz aos
empregados que têm que “vestir a camisa” (do patrão, ou da
empresa) porque se não, podem perder seus empregos. Assim, até
um(ou uma) caixa de supermercado passa as compras da forma mais
rápida possível, quase num desespero, sem chance para dar uma
palavra com a pessoa que faz as compras, mesmo que seja alguém que
se mostre precisando de ajuda, com
alguma dificuldade. Imagine um(a) cliente que tem consigo uma
criança que está cansada de esperar pelas compras das quais não
participa e nem entende. “Perder” dez segundos para dar uma
ajuda, ou uma palavra amiga à criança pode parecer, no racionalismo
de mercado, um absurdo, um abuso, um desrespeito a quem vem atrás na
fila do caixa, que também sente-se com pressa pela mesma lógica de
que “tempo é dinheiro”.
Entre outras situações de
vida, nos interessa falar sobre a escola. Lá também impera o
racionalismo de mercado, que impõe uma aula em que as explicações
sejam as mais diretas possíveis, e que direcionem para que
estudantes sejam logo capazes de fazer as questões ou exercícios
que virão em seguida. Qualquer dúvida de estudante, que fuja um
pouco disso, será vista como inadequada, inconveniente, porque
atrasará os trabalhos previstos e diminuirá o rendimento das aulas.
Um desvio será considerado como algo que atrapalha a aula, porque
aumentará o tempo para se chegar aos “exercícios feitos” e à
produtividade planejada. Na escola não existe mercado, mas a lógica
capitalista, do racionalismo de mercado nos leva a considerar que
“explicação dada”, “exercícios feitos” e questões
respondidas” são como se fossem o “lucro” da aula. O produto
das vendas serão as notas em provas que atestarão o rendimento do
trabalho realizado.
Esse modo de pensar, o do
capitalismo, e do racionalismo de mercado, torna-se senso comum e se
impregna no pensamento de toda gente, como dizem os autores a seguir:
A base desse
discurso [capitalista] amplificado no âmbito planetário é um senso
comum econômico, uma doxa, um sistema de crenças e valores, uma
visão comum de mundo que, reduzida a seus traços mais básicos,
implica extensão do éthos econômico a todas as esferas da
atividade humana. Implica portanto uma redução de todas as coisas à
mercadoria e a transformação de todas as pessoas em agentes
propriamente econômicos.(1)
Os que defendem o
capitalismo rotulam-se de liberais, palavra que deriva de livre e
liberdade, mas a realidade mostra que é diferente. Empresários de
todo o planeta usam mecanismos pelos quais certo grupo domina uma
parte do mercado já desenvolvido, e não permitem a entrada de
qualquer um, mas somente de pessoas ou empresas que possam ser
inseridas numa cadeia de comando e dependência já existente. A
livre concorrência é algo que só acontece em certos momentos e
quando escapa ao controle existente. Não existe livre concorrência.
Os capitalistas lutam para que não exista. Como exemplo podemos ver
as lojas que vendem automóveis novos que são chamadas de
concessinárias porque só podem funcionar com autorização das
empresas montadoras; existem os distribuidores de jornais que
precisam de autorização da empresa editora; as linhas de ônibus,
dependem de autorizações que vêm do poder público, mas em muitos
casos são monopólio e fruto de disputas empresariais, algumas que
geram até assassinatos. Esses e muitos outros exemplos, que podem
ser encontrados, mostram que existe uma organização
macro-econômica-social que controla o mercado. Mesmo que uma pessoa,
ou empresa, tenha dinheiro e capital suficiente, precisa submeter-se
às regras e ser aceita pela parcela de empresários que controla
dado segmento do mercado. Formam-se redes de controle e o mercado,
apesar de ser grande não é livre. Trata-se de um emaranhado de
redes de poder e controles que vão além do fator econômico.
Dantas (2) lembra que não é certo dizer monopólio mas oligopólio:
uma situação em que poucas empresas detêm o controle da maior
parcela do mercado.
De outro lado podemos
refletir: quem é mais livre? Uma pessoa que se permite “perder
tempo”, ou perder resultado, para ser solidária com quem precisa?
Aquela pessoa que se dedica à sociedade, em geral, e que trabalha em
lógicas sociais que favoreçam grupos historicamente oprimidos? Ou,
liberdade significaria a pessoa fazer o que a vontade lhe indica ?
Como defender um ponto de vista sem considerar o coletivo, a
sociedade? Não “perder tempo” é ser livre?
Vale refletir. Até que
ponto queremos deixar a lógica de mercado mandar em nossa sociedade?
REFERÊNCIAS
- BIANCHETTI, Lucídio; VALE, Ione R.; PEREIRA, Gilson R.M. O fim dos intelectuais acadêmicos: induções da Capes e desafios às associações científicas. Campinas, SP : Autores Associados, 2015.
- DANTAS, Gilson. Breve introdução à economia mundial contemporânea: acumulação do capital e suas crises. Brasília, 2012. Disponível em <http://www.esquerdadiario.com.br/capitalismo-um-sistema-senil-por-que>. Acesso em 2018.11
Bom dia, gostei bastante do texto, fica nítido a necessidade de mudanças em todas as instituições para que a sociedade tenha condições de refletir e fazer críticas ao capitalismo desumano que reduz as pessoas a produtos ou mercadorias.
ResponderExcluirótimo texto.
ResponderExcluirCom essa lógica as pessoas se encontram cada vez mais "adoecidas" e reféns de um sistema, que incentiva adoção de padrões de comportamentos, se tornando cada vez mais presas aos interesses que o capital pode proporcionar. Lutam tanto para "ter" que se perdem, deixando de "ser". Daí tantas doenças marcando esse momento de transição (as doenças advindas das frustrações, das perdas, inclusive dos contatos e relações humanas; a depressão e uma série de distúrbios neurológicos) o que desencadeia a falta de esperança num mundo melhor, chegando muitas vezes a perderem até as perspectivas de vida. Cada ser é um universo único de possibilidades e cabe a cada um, refletir sobre suas escolhas, o que torna a vida mais leve e a existência valer a pena.O estado de "sentir-se livre" ninguém pode nos roubar, porque é algo bem mais profundo e sutil. Podemos estar presos, e livres em nosso campo mental. Existem tantos outros que se "encontram livres", mas presos em si mesmos, ou presos às imposições e toda uma leva de normas que são impostas visando interesses que não são para o bem comum. Que na Educação, o exercício para a liberdade aconteça cada vez mais, para que nossos jovens possam refletir e discernir, e assim, cada vez mais plenos, possam fazer suas escolhas com mais consciência e auto respeito, não sendo induzidos e programados como máquinas.
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