UM OLHAR SOBRE A
COLETA SELETIVA E A RECICLAGEM NO MUNICÍPIO DE NEPOMUCENO MG: A
COOPERATIVA RECLICLANEP.
Para citar esse artigo:
LIBERATO,
Vanderleia ; SILVA, Barbara ; SANTOS, Vladimir ; VALLIN, CELSO . Um
olhar sobre a coleta seletiva e a reciclagem no município de
Nepomuceno MG: a cooperativa Reciclanep. In: I Congresso
Internacional e III Congresso Nacional Movimentos Sociais e Educação
? 20 a 22 de setembro. UESC, 2016, Ilhéus BA. I Congresso
Internacional e III Congresso Nacional Movimentos Sociais e Educação
? 20 a 22 de setembro. UESC. Ilhéus BA: UESC, 2016. v. único
Resumo: Nos últimos anos, o debate sobre a preservação ambiental e os problemas ambientais tem sido alvos de discussões e o que mais se destacam entre eles é o acúmulo de resíduos sólidos. Nesse contexto, a coleta seletiva tem sido apontada como uma das alternativas promissoras no sentido de auxiliar na diminuição do volume de resíduo sólidos e também como uma forma de gerar renda para a população em condição de vulnerabilidade social e econômica. Este estudo é resultado de uma pesquisa feita na cidade de Nepomuceno MG e teve como objetivo conhecer o trabalho da cooperativa de catadores de materiais recicláveis do município de Nepomuceno (RECICLANEP) e os benefícios desta atividade. Para atingir tal objetivo, foi feita a observação do cotidiano dos trabalhadores cooperados e, também, entrevistou-se os cooperados e o administrador da cooperativa. Por meio dos resultados alcançados, foi possível conhecer a história de criação da cooperativa e como ocorre o processo de coleta seletiva no município. Foram encontrados muitos benefícios provenientes do trabalho na Cooperativa tanto para os antigos trabalhadores do lixão, para a cidade e para o meio ambiente.
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Introdução
Ao
longo dos anos, os problemas ambientais tem sido alvo de debate em
vários campos de pesquisa. À medida que crescem os problemas, são
propostas novas alternativas para minimizá-los.
A reciclagem é uma
forma de destinar parte do resíduo sólido produzido de forma
responsável e vários materiais podem ser reciclados, entre eles, o
vidro, o metal, o alumínio, o papel, plástico entre outros. Assim,
por meio da reciclagem, obtém-se a diminuição significativa da
poluição do ambiente.
Neste
cenário a coleta seletiva torna-se uma ferramenta importante
na promoção da reciclagem e seus benefícios são vários e alguns
deles são destacados por Rodrigues e Cavinatto (2000): redução do
resíduo sólido na fonte geradora, reaproveitamento de matérias
primas, geração de renda com a inclusão social, minimização do
impacto ambiental causado pelo aterramento de resíduos no solo e da
poluição das águas e do ar e aumento da vida útil dos aterros
sanitários.
Na atualidade, boa
parte das embalagens dos produtos consumidos pode ser separada e
destinada ao processo de reciclagem. Por meio deste processo, novos
materiais surgem dando origem a outros produtos que podem ser
absorvidos pelo mercado. No entanto, para que o processo de
reciclagem seja possível é preciso que ocorra, primeiramente, a
coleta seletiva. Para tanto, a população precisa ter consciência
de seu papel participativo.
O processo da
reciclagem tem levado muitos desempregados a buscar trabalho neste
setor e desse modo conseguir renda para manterem suas famílias.
Associações e Cooperativas de catadores de materiais recicláveis
já permeiam em grandes e pequenos centros urbanos por todo o Brasil
trazendo benefícios a toda população.
Entendendo
a importância da coleta seletiva e suas contribuições para o
ambiente, o tema foi alvo de estudos por mestrandos do Programa de
Pós Graduação em Educação da Universidade Federal de Lavras,
durante a disciplina Ensino, Cultura e Meio Ambiente. O trabalho teve
como objetivos conhecer o cotidiano da Cooperativa de
materiais recicláveis de Nepomuceno (RECICLANEP), e perceber como os
sujeitos da Cooperativa avaliam a participação da sociedade além
da contribuição da mesma para que o trabalho da cooperativa
aconteça de forma efetiva.
O lixo como
problema social e ambiental
Durante a revolução
industrial vários fenômenos aconteceram. Os modos de produção
artesanal e familiares sofreram um declínio e as indústrias de
produção em grande escala passaram a ser dominantes. Impulsionado
por essa transformação houve uma grande migração dos povos das
áreas rurais para as áreas urbanas. Nesse sentido cada vez mais
temos o crescimento das cidades e a diminuição do meio rural.
Segundo Mucelin (2008) essa crescente mudança do meio urbano tem
causado muitos impactos ambientais como, por exemplo, a produção
exacerbada de resíduo motivada pelo consumismo exagerado.
Atualmente os
resíduos sólidos produzidos pelas cidades seguem uma classificação
pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) NBR 10004 de
2004. O objetivo dessa normatização é classificar os resíduos
sólidos quanto aos seus riscos potenciais ao meio ambiente e a saúde
pública a fim de que tenham um gerenciamento adequado. Ainda segunda
a NBR 10004/2004 resíduos sólidos tem a seguinte definição:
Resíduos nos
estados sólidos e semi-sólido, que resultam de atividades de origem
industrial, doméstica, hospitalar, comercial, agrícola, de serviços
e de varrição. Ficam incluídos nesta definição os lodos
provenientes de sistemas de tratamento de água, aqueles gerados em
equipamentos e instalações de controle de poluição, bem como
determinados líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu
lançamento na rede pública de esgotos ou corpos de água, ou exijam
para isso soluções técnica e economicamente inviável em face à
melhor tecnologia disponível. NBR 1004/2014.
A partir desta
definição os resíduos sólidos seguem a seguinte classificação
de acordo com a normatização:
Resíduos Classe I
– Perigosos
Resíduos Classe
II- Não Perigosos
3- Resíduos
Classe II A- Não Inertes
4- Resíduos
Classe II B- Inertes
De acordo com Costa
e Fonseca (2009) os novos padrões de consumo resultantes dos avanços
tecnológicos tem gerado uma produção de resíduos crescente em
ritmo superior a capacidade de absorção da natureza. Além de
grandes quantidades o descarte incorreto desses resíduos é capaz de
colocar em risco e comprometer os recursos naturais.
Tendo em vista a
crescente problemática do uso de recursos naturais e do descarte de
resíduos sólidos, a partir dos anos 70 iniciou-se politicas
objetivando o esclarecimento de normas referentes à forma mais
adequada de coleta e, principalmente de disposição do material
descartado. Em países industrializados a tendência é de
estabelecimento de critérios e incentivos que permitam a implantação
de programas de prevenção e redução de resíduos na fonte
geradora além de programas de recuperação dos recursos dos
resíduos (BROLLO e SILVA 200).
O
grande avanço tecnológico e o processo de industrialização, em
todo o mundo, tem gerado um grande acúmulo de resíduos sólidos. Em
2010 no Brasil, surge a Lei N. 12.305/2010, que instituiu a Política
Nacional de Resíduos Sólidos, tendo como meta resolver o problema
da destinação final adequada no Brasil, com os princípios, os
objetivos, as diretrizes e os instrumentos relativos à gestão
integrada e ao gerenciamento de resíduos sólidos, estabelecendo, em
seu art. 54, o prazo de 04 (quatro) anos para a extinção completa
dos lixões e a disposição final dos resíduos sólidos em aterros
sanitários.
No entanto, cinco
anos após a lei instituída acima, prorroga mais uma vez o prazo
para o fim dos lixões, que começa no ano de 2017, como prazo mínimo
para a extinção do mesmo, sendo que este prazo varia de acordo com
o númer de habitantes do município, se estendendo até 2021 e
diante dos prazos definidos na legislação a coleta seletiva torna
uma ferramenta que vem para contribuir uma boa parte com a extinção
dos lixões. (BRASIL, 2015)
A coleta seletiva
está amparada no decreto Nº 5.940, de 25 de outubro de 2006 onde há
a separação dos resíduos recicláveis descartados pelos órgãos e
entidades da administração pública federal direta e indireta, na
fonte geradora, e a sua destinação às associações e cooperativas
dos catadores de materiais recicláveis, e dá outras providências e
segue em seus respectivos artigos:
Art. 1o A
separação dos resíduos recicláveis descartados pelos órgãos
e entidades da administração pública federal direta e indireta, na
fonte geradora, e a sua destinação às associações e cooperativas
dos catadores de materiais recicláveis são reguladas pelas
disposições deste Decreto.
I - coleta
seletiva solidária: coleta dos resíduos recicláveis descartados,
separados na fonte geradora, para destinação às associações e
cooperativas de catadores de materiais recicláveis;
Art. 3o Estarão
habilitadas a coletar os resíduos recicláveis descartados pelos
órgãos e entidades da administração pública federal direita e
indireta as associações e cooperativas de catadores de materiais
recicláveis que atenderem aos seguintes requisitos:
I - estejam
formal e exclusivamente constituídas por catadores de materiais
recicláveis que tenham a catação como única fonte de renda;
II - não
possuam fins lucrativos;
III - possuam
infraestrutura para realizar a triagem e a classificação dos
resíduos recicláveis descartados; IV - apresentem o
sistema de rateio entre os associados e cooperados.
Em relação a
separação dos resíduos sólidos existem diferentes formas de
descarte de resíduos como Aterros Sanitários, Lixões,
Incineradores, Reciclagem e Usinas de compostagem. Dentre os destinos
possíveis para o lixo, um dos mais agressivos é o descarte sobre o
solo a céu aberto e sem critérios técnicos e ações de proteção
ao meio ambiente conhecidos como lixões (AZEVEDO, 2015). Esse lixo
acumulado libera um líquido de coloração escura e mal cheirosa
chamado chorume, que contamina o solo e as águas subterrâneas
(ARAUJO et. al. 2006).
Além disso,
Pereira Neto (2007) ressaltam que esses ambientes são propícios
para proliferação de vetores de doenças e para o crescimento da
população de ratos baratas e moscas entre outros animais. A
associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos
Especiais (ABRELPE, 2013) revela que 3.344 municípios ainda
descartam os resíduos em locais impróprios sendo 1569 desses
municípios em lixões, ainda que esse seja uma forma inadequada de
disposição final.
Neste sentido a
reciclagem feita de modo correto, no qual todos os resíduos sólidos
são devidamente separados tem sido uma das opções mais adequada
para o descarte do resíduo solido, porém, não pode desvincular da
diminuição do consumismo, pois, não é pelo fato de ter um destino
final das embalagens, que o consumo deve ser promovido.
Além dos problemas
ambientais os lixões também são a fonte de grandes problemas
sociais. Siqueira (2008), afirma que as condições de trabalho dos
catadores de materiais recicláveis são precárias. As famílias
improvisam barracos nas proximidades dos lixões e convivem com os
resíduos diariamente, as crianças brincam sobre os resíduos
sólidos enquanto os pais fazem a seleção de materiais recicláveis
e de materiais que julgam em condições de uso. Muitas das vezes o
contato direto com este ambiente podem causar problemas de saúde
para os envolvidos pelo fato de conviver com transmissores de doenças
e materiais cortantes. As cooperativas de catadores são importantes
para a melhoria dessa sociedade exposta a tantos problemas.
Além do problema
social de quem trabalha diretamente com o manuseio resíduo sólido,
outros fatores podem ser considerados como efeitos negativos do
excesso do mesmo para a sociedade como, por exemplo, contaminação,
intoxicação e poluição. Segundo Ferreira (2001), a decomposição
do lixo forma gases que podem provocar muitas doenças inclusive
doenças respiratórias, causar explosões e poluição do ar.
Tendo em vista os
problemas sociais e ambientais causados pelos resíduos sólidos, é
necessário um esforço para que em primeiro lugar, o consumismo seja
diminuído, o que exigiria menos matéria prima, em segundo lugar,
para que o poder público se empenhe em dar o descarte correto ao
resíduo sólido e propiciar condições para que a reciclagem possa
se tornar fonte primaria de descarte em nosso país.
Associações e
Cooperativas como uma das alternativas para o meio ambiente.
Ribeiro e
Besen (2006) mostram que a organização dos catadores no Brasil
iniciou-se em 1985, com a formação da Associação de Carroceiros
no Município de Canoas, e em 1986, com a fundação da Associação
de Catadores de Material de Porto Alegre, da Ilha Grande dos
Marinheiros, na Região Metropolitana de Porto Alegre. Em São Paulo
constituiu-se a organização dos Sofredores de Rua (1986), que se
tornou a Cooperativa de Catadores Autônomos de Papel, Aparas e
Materiais Reaproveitáveis – Coopamare (1989), e em Belo Horizonte
(1990) formou-se a Associação de Catadores de Papel, Papelão e
Material Reaproveitável – Asmare.
De acordo com
Rodrigues e Cavinato (2000), o processo de reciclagem significa
transformar produtos usados em matéria prima para novos produtos
para o próprio consumo. Esta necessidade foi despertada pelos seres
humanos a partir do momento em que se verificaram os benefícios que
estes procedimentos trazem para o planeta terra. Por meio do processo
de reciclagem, preserva-se o meio ambiente e também se geram
condições de trabalho para muitas pessoas que se envolvem no
processo.
O
processo de reciclagem tem levado muitos desempregados em várias
cidades a buscar trabalho neste setor e assim conseguir renda para
manterem suas famílias. Associações e Cooperativas de catadores de
materiais recicláveis já permeiam em grandes e pequenos centros
urbanos por todo o Brasil trazendo benefícios a toda população.
Muitos municípios já contam hoje com a coleta seletiva feita em
alguns casos por parcerias com prefeituras para melhoria de condições
de trabalho, na qual o material a ser reciclado já chega as fábricas
pronto para ser organizado, evitando assim um árduo trabalho por
meio de carrinhos manuais.
Diante deste fato,
alternativas como a reciclagem tem causado uma grande mudança no
atual cenário ambiental, uma vez que são destinados às
cooperativas e associações de matérias recicláveis uma boa parte
do resíduo sólido produzido pelas pessoas e também pelo processo
de industrialização.
Pereira (2013)
relata que o percentual de cidades que mantêm
cooperativas e associações de catadores chegam a 65% do agregado. O
apoio às cooperativas se baseia em maquinários, galpões, ajudam de
custo com água e energia elétrica, capacitações e investimento em
educação ambiental para que aconteça um trabalho de qualidade.
O trabalho é
realizado por meio de uma separação de muitos produtos por meio de
coleta seletiva, vindo de várias fontes do município, como casas
residenciais, empresas de diferentes comércios, indústrias,
escolas, entre outras e delas se destacam os principais objetos,
vidro, alumínio, papel, metal, óleo de cozinha e o plástico, e por
meio da reciclagem obtém-se a diminuição significativa da poluição
do solo, da água e do ar.
Na atualidade, em
boa parte dos produtos consumidos a embalagem pode ser separada e
destinada ao processo de reciclagem, e por meio deste processo novas
materiais surgem dando origem a outros produtos que podem ser
absorvidos pelo mercado, e, além disso, podem gerar mais
matérias-primas, reduzirem os gastos com os custos de produção.
A participação da
população nos programas de coleta seletiva é voluntária na
maioria das cidades. A mobilização para a separação dos materiais
recicláveis na fonte geradora – papéis, vidros, plásticos e
metais, entre outros – é realizada através de campanhas de
sensibilização promovidas junto aos bairros, condomínios, escolas,
comércio, empresas e indústrias (RIBEIRO; BESEN, 2006).
Diante das
diferentes alternativas para o destino final dos resíduos sólidos
produzido, nota-se que é possível verificar a grande importância
do trabalho das cooperativas e associações dentro do município,
considerando que uma das grandes preocupações do momento é a
situação ambiental no mundo e tendo em vista que o resíduo sólido
produzido tem causado sérios danos à natureza, a alternativa acima
vem como meio de trabalho, inclusão social e também ferramenta de
proteção ambiental. Cabe ressaltar que além das cooperativas e
associações, existem também os catadores individuais que fazem seu
trabalho de forma autônoma.
Braz et al. (2014)
mostram que os catadores de resíduos recicláveis estão
subdivididos em três categorias: os catadores de rua e dos lixões,
os que trabalham de maneira autônoma e os organizados em associações
e cooperativas. No Brasil, estima-se que o número de catadores de
materiais recicláveis seja de aproximadamente 500.000(quinhentos
mil), estando 2/3 no estado de São Paulo. Conforme dados da
Companhia Municipal de Urbanização de Goiânia – COMURG, em
Goiânia, no ano de 2004, foram identificados 506 catadores que
coletam materiais recicláveis na cidade (MEDEIROS; MACEDO, 2006,
p.65).
Percebe-se que o
trabalho dos catadores é uma garantia de trabalho feito por eles
mesmo, uma vez que tanto a decisão de ir para ruas, lixão, ou até
mesmo a iniciativa de uma associação ou cooperativa, é uma tomada
de decisão individual, e decisão muitas vezes forçada, porque
muitos deles não conseguem empregos formais e veem na reciclagem de
produtos uma única fonte de trabalho para tirar o seu sustento e da
sua família.
No entanto, diante
de todas as mazelas, precarização e dificuldades encontradas pelas
associações e cooperativas, as mesmas estão crescendo de forma
significativa por todo país além de se tornarem uma contribuição
muito grande na prevenção do meio ambiente e na próxima seção
será abordado os benefícios ambientais que são promovidos pelas
mesmas.
A coleta seletiva e
a reciclagem têm um papel fundamental para o meio ambiente, por meio
delas diminuem a retirada de novas matérias-primas que seriam
retiradas da natureza. Pode-se definir a coleta seletiva da seguinte
forma “é um processo de recolhimento de materiais recicláveis:
papéis, plásticos, vidros, metais e orgânicos, previamente
separados na fonte geradora e que podem ser reutilizados ou
reciclados.” A coleta seletiva funciona, também, como um processo
de educação ambiental na medida em que se sensibiliza a comunidade
sobre os problemas do desperdício de recursos naturais e da poluição
causada pelo resíduo sólido.
Metodologia
O método de
pesquisa foi observação e questionário semiestruturado, sendo que
esta se trata de uma pesquisa qualitativa e descritiva. Os dados
foram também coletados por meio de troca de informações com os
cooperados e o administrador da cooperativa. Para atingir os
objetivos da pesquisa, foram pesquisados dados sobre a estruturação
da cooperativa, sobre a coleta seletiva, quantidade de material,
escolaridade, salário e sobre as condições de trabalho dos
cooperados.
Procedimentos
Na medida em que
acontecia o processo de observação, as dúvidas iam surgindo e a
partir delas, procurava-se fazer novas observações. Para analisar
os dados, utilizou-se a técnica de análise de conteúdo das
informações repassadas pelo administrador e a leitura das anotações
que foram realizadas durante o período de observação.
Locus da pesquisa
O trabalho foi
realizado em uma cooperativa de catadores de matérias recicláveis
do município de Nepomuceno, no estado de Minas Gerais. A mesma se
encontra a 3 km da cidade, e funciona próximo ao antigo lixão. O
trabalho acontece em um galpão construído pela Prefeitura, que
possui em torno de 500m², tendo apenas cobertura, possui uma copa e
um banheiro.
A Cooperativa foi
fundada em setembro de 2013 em parceria com a Prefeitura Municipal. O
nome fantasia adotado foi Reciclanep. A cooperativa está formalmente
regularizada, uma vez que possui alvará de funcionamento, paga seus
tributos ao INSS, recolhe FGTS dos trabalhadores e paga todas as
despesas junto da Receita Federal.
Atualmente, são 14
cooperados que vivem da renda da cooperativa e três funcionários
que são pagos pela mesma. Os cooperados são oriundos do antigo
lixão, sendo seis homens e oito mulheres. A cooperativa é
administrada por um funcionário contratado pela cooperativa
A Prefeitura
subsidia a Cooperativa repassando os valores referentes às despesas
com o pagamento de Receita Federal.
Resultados e discussão
Entre os benefícios
da cooperativa de catadores de materiais recicláveis do município
de Nepomuceno podem ser destacados os seguintes: a coleta
seletiva contribuiu para aumentar a consciência ecológica da
sociedade, pelo fato de chegar até a cooperativa, vinte cinco por
cento de material reciclável que antes eram todos destinados para o
lixão; auxilia na geração de renda para os antigos trabalhadores
do lixão; proporciona benefícios econômicos para o município uma
vez que os cooperados contam com um salário mensal; diminuiu o
trabalho feito com a limpeza urbana devido ao processo de coleta
seletiva.
Uma descoberta que
merece destaque é o fato de alguma residência não disponibilizar
para o caminhão de coleta alguns tipos de materiais que são
considerados de maior valor como pet, alumínio e metal. Isso ocorre
porque o mesmo comprador que compra os materiais recicláveis da
cooperativa compra também diretamente da população passando nas
casas. Com isso, os moradores preferem ganhar algum dinheiro vendendo
diretamente estes materiais do que fornecer para a cooperativa.
Segundo os
cooperados a venda dos materiais é feita dentro do município devido
ao fato que eles ainda não têm uma produção suficiente para que
sejam vendidos na “REDE”
Aquino et al (2009)
mostra que a mesma é formada pela união de varias associações e
cooperativas que se tem como objetivo propor uma forma de organização
logística para as associações de catadores de materiais
recicláveis realizarem a comercialização direta de seus produtos
às indústrias recicladoras, visando à agregação de valor e
partir da organização das associações de catadores em rede, todas
elas conseguem comercializar produtos diretamente com indústrias
recicladoras, e, juntas, obteriam uma agregação de 32% no valor dos
produtos comercializados.
Com isso nota-se
que se a população contribuísse mais com a separação do
material, a quantidade de produção aumentaria e com isso o ganho
econômico dos cooperados da cooperativa também seria maior. Outro
fator que chama a atenção foi um dos relatos de uma cooperada, que
disse que existe uma grande procura de novas pessoas que querem se
incorporar ao grupo, mas segundo a mesma isto não é possível
devido à baixa produção, e que hoje eles contam com 25% de
material reciclável e se chegasse a 40 % eles não daria conta, por
causa do trabalho ser quase todo manual, e só assim seria necessário
ter mais cooperados.
Embora a
cooperativa tenha sido criada com o intuito de retirar os catadores
de materiais recicláveis do lixão, esse objetivo não foi
totalmente atingido. Isso ocorre porque há uma parcela significativa
da população que ainda não contribui com o trabalho da
cooperativa, ou seja, não separa o resíduo sólido reciclável do
resíduo sólido descartável nas residências.
Assim, muitos
cooperados ainda vão para o lixão – que fica próximo a usina de
reciclagem – para buscar materiais que são recicláveis e que não
deveriam estar no lixão. Nessa situação, mais uma vez, fica
evidente a necessidade de promover ações de conscientização da
população.
A coleta seletiva
também é feita em parceria com a Prefeitura que fornece o motorista
para fazer o trabalho do caminhão e os funcionários da cooperativa
trabalham de forma alternada no recolhimento dos materiais
recicláveis nas portas das residências e essa coleta é feita todos
os dias, alternando a rota de passagem nos bairros.
A estimativa de
quantidade de material coletado circula entre 3 a 4 toneladas por
dia. No entanto, conforme informam os cooperados, chega-se a usina de
reciclagem, todos os dias, juntamente com o material que é
reciclável, uma quantidade significativa de material que é refugado
como madeira, isopor, tecidos, e este material são retirados do
local todos os dias e levado para o lixão.
No que se refere à
venda do material reciclável, o principal comprador é do próprio
município, sendo ele proprietário de uma usina de reciclagem
autônoma e particular. Este, no entanto, também faz coleta seletiva
nas ruas da cidade, comprando diretamente dos moradores os materiais
de maior valor. Isso se configura como um empecilho aos cooperados
que acabam não recebendo estes materiais de maior valor como pet,
latas de alumínio, metais entre outros. Tendo em vista que a
população vende diretamente a este coletor, eles não entregam
estes materiais gratuitamente para a reciclagem preferindo ganhar com
esta negociação.
Observa-se,
portanto, que embora a coleta seletiva tenha sido implantada, não
houve conscientização por parte da população de que o esforço em
selecionar o material para destinar à usina é benéfico no sentido
de gerar renda para cooperados em condições de vulnerabilidade
econômica. Conforme discutem Rodrigues e Silva
(2009, p.175), a educação ambiental poderia ser muito benéfica
nesse sentido, uma vez que “a educação ambiental é um dos meios
para se adquirir as atitudes, as técnicas e os conceitos necessários
à construção de uma nova relação com o meio ambiente”.
A educação
ambiental conscientizadora poderia ser de grande utilidade
para ajudar a população a repensar suas ações uma vez que ao
disponibilizar esses materiais para a coleta seletiva ela estaria
contribuindo para a geração de renda dos cooperados que vivem em
condições de vulnerabilidade social e econômica. Assim, deve-se
mostrar como é importante que se tenha ações conjuntas quando se
trata de coleta seletiva, ou seja, cooperativa e prática de educação
ambiental apesar de encontrar diversos conflitos devem tentar unir-se
com o poder público e com a sociedade para que aconteça um
movimento realmente favorável de melhoria de qualidade de trabalho e
vida para os trabalhadores.
O sistema de trabalho dos cooperados e funcionários
O trabalho dos
cooperados é fazer a triagem e separação dos materiais, sendo que
todo material é separado por qualidade, sendo: pet, por cores
separadas, papelão liso, de cor, úmido, molhado, papel branco,
entre outros, e segundo os cooperados cada um tem seu preço,
dependendo de quais situações ele chega ate a usina. Esse processo
não segue uma divisão formal do trabalho. Cada cooperado atua em
forma de rodízio, ou seja, eles não possuem um posto de trabalho
fixo. Um dia, atua separando plástico, no outro separando papel, no
outro embalando para venda e assim por diante.
Apesar da criação
da cooperativa em 2013, ainda hoje, as máquinas não estão
funcionado porque o sistema de voltagem das mesmas é incompatível
com o sistema da usina. A Prefeitura ainda não providenciou a
adequação apesar de ser um pedido constante junto aos órgãos
competentes. Por isso, praticamente todo o trabalho de triagem,
prensagem e embalagem é feita manualmente.
A carga horária de
trabalho dos cooperados é de 8 horas diárias, começando logo bem
cedo e com termino às catorze horas. Permanece sempre um vigia no
local, pois há relatos de roubo e vandalismo na cooperativa. Eles
fazem suas refeições no próprio local. Os cooperados utilizam
equipamento de segurança, como luvas, máscaras, botinas entre
outros e reconhecem a importância do uso dos mesmos. Os cooperados
relataram que há indagações a respeito do horário de trabalho dos
mesmos, pois segundo eles muitas pessoas acham que o trabalho deveria
acontecer o dia todo.
Diante dos relatos
dos cooperados outro ponto importante a ser destacado quanto ao
trabalho realizado, onde todas as decisões são tomadas em união do
grupo, por meio de assembleias para que tudo seja votado. A
convivência entre os cooperados criam apresenta relações de
respeito e de cumplicidade. Em um dos relados a cooperada relatou a
compreensão e o entendimento com aqueles trabalhadores de idade mais
avançada que não tem uma produção elevada. A partir disto podemos
perceber a satisfação dos cooperados em relatar um trabalho onde há
espaços para descontração, brincadeiras e respeito mutuo.
O salário mensal
que os cooperados recebem está entre R$800,00 e R$1.000,00. Esse
salário é pago com a venda dos materiais recicláveis uma vez que a
prefeitura subsidia apenas os gastos com Receita Federal, motorista e
manutenção do caminhão usado na coleta seletiva.
5. Considerações gerais
Entre os benefícios
da cooperativa de catadores de materiais recicláveis do município
de Nepomuceno podem ser destacados os seguintes: a coleta
seletiva contribui para aumentar a consciência ecológica da
sociedade; auxilia na geração de renda para os antigos
trabalhadores do lixão; proporciona benefícios econômicos para o
município uma vez que os cooperados contam com um salário mensal;
diminuiu o trabalho feito com a limpeza urbana devido ao processo de
coleta seletiva.
Um dos benefícios
que merece mais destaque é a mudança significativa da quantidade de
resíduos sólidos que é retirado do meio ambiente e que se torna
matéria-prima para novas embalagens diminuindo os impactos
ambientais.
No caso da
Reciclanep é notável que a parceria com a prefeitura local seja uma
das condições que possibilitam o funcionamento da mesma, porque os
ganhos pela produção não compensaria tributos com a receita, como
também despesa com caminhão de coleta.
Outro ponto que
merece destaque está relacionado com a forma de divisão do
trabalho, percebemos que o regime de trabalho dos mesmos foge as
bases do capitalismo, e o trabalho é baseado na cooperação com
respeito, compreensão e divisão de trabalho de forma justa. Os
associados relataram que gosta de trabalhar na cooperativa, e estão
no local por opção.
Em relação ao que
é resíduo sólido na atualidade é notável que a palavra conota a
outras formas de entendimento, uma vez que para a grande maioria da
sociedade descarta “resíduo sólido” para muitos não é resíduo
sólido, e tomando como caso especifico da Cooperativa de Nepomuceno,
o material reciclável que chega até a usina de separação, é
preciso que tenha um vigia vinte quatro por dia, porque caso o
contrário pessoas vão até o local para furtar o material já
recolhido.
Pode-se, portanto,
concluir este trabalho afirmando que a coleta seletiva e a
organização dos trabalhadores catadores de resíduos sólidos em
cooperativa se configuram como uma alternativa importante e viável
para contribuir com os impactos ambientais na perspectiva de
minimizar o problema do resíduo sólido e da falta de renda dos
sujeitos envolvidos nesta atividade. Mas, se estes dois aspectos não
foram implementados juntamente com ações sociais conjuntas que
visam promover conscientização da população, como também buscar
juntamente seus direitos ao poder publico, a necessidade de
transformar se perde no meio do caminho.
Portanto, por meio
dos resultados obtidos entende-se o município
pesquisado precisa ser conscientizados em relação a sua
participação junto ao meio ambiente, entendendo que o meio ambiente
não é uma parte em si só, mas sim tudo que o cerca e que o homem
faz parte de tudo que se relaciona com o meio ambiente. Os sujeitos
devem ter condições de participar e agir sobre o problema
encontrando meios para solucioná-los sustentavelmente.
Loureiro
(2004) define participação da seguinte forma: participar é
compartilhar poder, respeitar o outro, assegurar igualdade de
decisão, propiciar acesso justo aos bens socialmente produzidos, de
modo a garantir a todos a possiblidade de fazer sua história no
planeta, de nos realizarmos em comunhão. Participação significa o
exercício da autonomia, com responsabilidade, com a convicção de
que a nossa individualidade se completa com a relação com o outro e
o mundo e que a liberdade individual passa pela liberdade coletiva.
Portanto,
conclui-se que uma Educação Ambiental critica transformadora,
emancipatória e libertadora deve ser pautada em um conhecimento vivo
e real, eles devem ser apropriados, construídos de forma coletiva,
cooperativa, continua, interdisciplinar, democrática e
participativa, com a intenção de se ter grupos ativos e
participantes na melhoria do meio ambiente, a autonomia de grupos
sociais na construção de alternativas sustentáveis, o amplo
direito à informação como condição para a tomada decisão,
mudanças de atitudes, aquisição de habilidades especificas, a
problematização da realidade socioambiental (LOUREIRO, 2010).
É preciso defender
a promoção de ações conjuntas para que se consiga realmente
promover maior qualidade de vida para a população seja no sentido
de retirar trabalhadores do lixão gerando renda para eles, como
também retirar o resíduo sólido reciclável do meio ambiente. No
caso de Nepomuceno em relação à educação ambiental, os
resultados deste trabalho mostram que é preciso um trabalho voltado
para esta área a fim de ter uma melhoria social significativa tanto
para os cooperados, como também para todo o município e um trabalho
que envolva ações educativas criticas e que desperte o olhar de
futuros pesquisadores podem ser objetos de estudo para uma nova
pesquisa.
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